quarta-feira, 18 de junho de 2008

Saussure

O batismo do rinoceronte Quindim é uma das traquinagens da boneca de pano criada por Monteiro Lobato, em Emília no País da Gramática. Em livro anterior, Reinações de Narizinho (1931), o personagem já aparecia, sem nome. O diálogo que dá registro a Quindim acompanha um conceito caro ao lingüista suiço Ferdinand de Saussure: a arbitrariedade do signo.

"Nisto dobraram uma curva do caminho e avistaram ao longe o casario duma cidade. Na mesma direção, mais para além, viam-se outras cidades do mesmo tipo.
- Que tantas cidades são aquelas, Quindim? - perguntou Emília.
Todos olharam para a boneca, franzindo a testa. Quindim? Não havia ali ninguém com semelhante nome.
- Quindim - explicou Emília - é o nome que resolvi botar no rinoceronte.- Mas que relação há entre o nome Quindim, tão mimoso, e um paquiderme cascudo destes? - perguntou o menino, ainda surpreso.- A mesma que há entre a sua pessoa, Pedrinho, e a palavra Pedro - isto é, nenhuma. Nome é nome, não precisa ter relação com o "nomado". Eu sou Emília, como podia ser Teodora, Inácia, Hilda ou Cunegundes..."

http://revistalingua.uol.com.br/textos.asp?codigo=11454

Metalingüística, por Monteiro Lobato

"O meu processo é anotar as boas frases, as de ouro lindo, não para roubá-las ao dono, mas para pegar o jeito de também tê-las assim, próprias. Dum de seus livros extrai 60 frases de encher o olho. Não releio mais esse livro - não há tempo - mas releio o compendiado, o extrato, e aspiro o perfume e saboreio. Formo assim um florilégio camiliano do que nele mais me seduz as vísceras estéticas. E não discuto nem analiso, porque seria fazer gramática, do mesmo modo que não analiso botanicamente um cravo ou uma gostosa laranja mexeriqueira. Cheiro um e como a outra."

[trecho de uma das correspondências de Monteiro Lobato ao amigo Godofredo Rangel, incluídas na coletânea de cartas A Barca de Gleyre (1944)].

terça-feira, 3 de junho de 2008

Diálogos do cotidiano

Nathália e Ygor, no carro.

- Ygor, conheci um cara muito legal ontem, acho que você vai gostar dele!
- Hmm, que bom. Mas ele é bonito ou é do tipo que você gosta mesmo?

@_@


Nathália e Luiz, pelo telefone.

(...)
- As pessoas não gostavam dela, ela sempre foi meio grossa, daquele tipo de pessoa que fala o que pensa e não tá nem aí se vão gostar ou não.
- Ah, sim, tipo eu.
- Não, Nathália. Nem tanto.

@_@³

segunda-feira, 2 de junho de 2008

The question is: who cares?


O TDAH atinge todos os aspectos da vida de uma pessoa: -pessoal: sentimentos de frustração e baixa auto-estima em função das dificuldades encontradas para desempenhar corretamente as mais diversas atividades podem levar a problemas psicológicos e de comportamento; -escolar: dificuldades de aprendizagem, levando a baixo rendimento escolar, repetência e abandono dos estudos; -social: problemas de relacionamento devido às características próprias do quadro, como falta de atenção nas pequenas coisas que fazem parte de uma relação equilibrada; falta de "desconfiômetro" no trato com as pessoas, sempre falando muito ou interrompendo e se metendo; incapacidade de acompanhar a norma dos grupos; etc. -afetivo: uma extensão dos problemas acima, pelos mesmos motivos; -profissional: a falta de organização, a dificuldade em manter o nível de atenção e a persistência no trabalho, a inquietação e a freqüente busca de estímulos variados fazem com que a maioria dos adultos com TDAH não consigam alcançar boa posição profissional ou status compatível com sua educação familiar ou capacidade intelectual.

O TDAH desaparece com a idade?

Não. Por tratar-se de um distúrbio neurobiológico, o TDAH não desaparece com a idade. O que pode acontecer é uma modificação dos sintomas, dependendo da evolução da criança, tanto na parte física como psicológica, afetiva, pedagógica e social. Por exemplo, a hiperatividade, tão explícita na criança, aparece no adulto como forma de inquietação interna, um desejo constante de mudanças ou de estímulos cada vez maiores. O desejo de mudanças pode fazer com que mude freqüentemente de emprego, assim com a busca de estímulos fortes pode levá-lo à prática de esportes radicais. A pessoa com TDAH precisa aprender a conviver com o TDAH, fazendo as acomodações necessárias ao longo da vida. Por isso a grande importância de um diagnóstico correto precoce, que possibilite à criança ter um atendimento adequado o mais cedo possível.

domingo, 1 de junho de 2008

Prova?

- Agora vamos guardar todo o material. Deixem na mesa lápis, borracha e apontador, mais nada.
- É prova, professora?
- Não... É... Não é, mas é como se fosse. Eu não vou ajudar a fazer e também não pode perguntar ao colega.
- Ah, então é prova.
- ...
Começam a fazer.
"Não era pra ter falado em prova... Será que eles vão ficar nervosos agora?", ela se pergunta.
Naquela escola já não se fazia prova. A maioria ali nunca estudara em outro lugar, então a coisa da prova era algo meio desconhecido, meio assustador.
Mas não assustador como é para a maioria de nós, que passamos pelas tais provas até hoje.
Assustador do tipo misterioso mesmo, uma coisa que todo mundo fala que é ruim mas que nem se sabe por que é tão ruim assim.
Vão entregando, uma a uma.
E ela corrige logo; não pode conter a curiosidade.
Primeira aluna, acerta tudo. Ufa!
Segundo, tudo.
Terceiro, quase tudo.
E assim vai, até o último.
Todos acertam tudo ou quase tudo.
Se valesse nota, nenhum tiraria abaixo de 9.
Os olhos dela enchem d'água.
- A professora tá chorando!
- Não, é que eu tô gripada, menino. Deixa de ser bobo.
"Já posso ensinar a divisão", ela pensa.

Café da manhã em Bariloche

Fazia frio em Bariloche.
Aquele era o último café que tomariam no hotel antes de voltarem para casa. Talvez o último momento juntos, pensaram. Mas só ela falou.
Chovia na janela.
Os olhares se encontravam o tempo todo, mas os pensamentos provavelmente estavam perdidos.
Havia muita conversa, mas não havia conversa.
Que horas são? O chocolate ainda tá quente?
A chuva fininha e gelada deixava Bariloche com um ar melancólico.
Saíram. O trem partiria em breve.
Mesmo caminho, diferentes destinos.
Despediram-se com um beijo, dentro do trem.
Ele desceu na estação seguinte, ela desceu na outra.